sexta-feira, 20 de junho de 2008

Mônica


Ela já não era bonita, mas conservava na cabeça e nas mãos um cheiro bom de borracha macia e perfumada. O corpinho já não tinha vestido. Depois de anos, era só velha espuma agora magrela e murcha. Essa era a Mônica, minha boneca, primeiro brinquedo, companheira de choros e de descobertas. Eu nem lembro minha idade na época. Só lembro que essa era minha única amiga real. Sim porque eu tinha um verdadeiro batalhão de amigas imaginárias também.

Mas foi na Mônica que ensaiei meus primeiros rabiscos com uma caneta e isso foi sim uma manifestação de afeto. Ganhei essa boneca por teimosia: me agarrei nela e não quis mais soltar, de modo que só restou à minha mãe tirar dinheiro da onde não tinha para comprá-la. Ela era nessa época linda, grande e cheirosa, com vestido vermelho e sapatinhos pretos.

O dia em que a rabisquei foi algo espontâneo e simples. Tomávamos chá com outras bonecas na sala. Comecei a achar bonito o traço que sempre as canetas faziam no papel. Então tomei uma decisão. Peguei a caneta, aquele objeto até então desconhecido e desengoçado entre meus frágeis dedinhos e fiz um risco em um papel. Depois um na parede. Feliz com a descoberta, chamei minha companheira Mônica para que eu pudesse compartilhar a beleza daquilo:


- Olha Mônica! Vou te deixar mais bonita!
Ela até gostou do novo visual. Eu também. Mesmo murcha e rabiscada, para mim ela era a mais linda do mundo.


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