sexta-feira, 22 de maio de 2009

Brasileiro, eu?

De tanto dizerem que o brasileiro não tem memória, acabamos mesmo nos esquecendo de tanta coisa...
De tanto ouvirmos falar que brasileiro é acomodado, a gente se acostuma...
Ou será que quem diz isso apenas tem razão?
Tenho orgulho de ser brasileira. Quase sempre. Porque há também ocasiões em que minha cara queima de vergonha.
Quando ouço uma estudante de geografia de universidade federal me dizer que vai sim votar em determinado político, e não importa todos os escândalos em que ele se envolveu, todas as acusações de desvio de verba que foram silenciadas. Não importa porque isso é passado. É, o passado não importa. Porque não importa também Fernando Collor de Mello ganhar força política novamente depois do Brasil se mobilizar para tirá-lo do poder num processo de impeachment.
E ninguém se importa com escândalos, desvios de verba, CPIs, dinheiro em cueca, em mala, em qualquer lugar que não seja investimento no povo brasileiro. Não importa.
Ninguém se incomoda com tudo que se vê na televisão, lê nos jornais sensacionalistas que mostram bunda e sangue, nas revistas que falam mal do povo brasileiro e exaltam aqueles que nos pisam. É, não importa. Eu vou votar porque ele faz uns asfaltos de má-qualidade, uns viadutos de espeto. Vou votar no político que rouba mas "faz". Faz investimentos na bolsa, em fazendas, no futuro brilhante dos próprios filhos.
A gente vota é naquele que não fala nada de coerente nas campanhas, mas tem um sorriso legal. Que tem propostas esdrúxulas, mas é gente do povo.
A gente é brasileiro e não desiste nunca.
A gente sorri no ônibus lotado que sobe de preço todo ano. Até reclamamos um pouco. Para os amigos no churrasco mirrado do sábado. Porque na hora de reclamar com quem é responsável por isso...Para que se incomodar?
A gente sorri pro velhinho que está em pé ao lado do banco em que estamos sentados. A gente ri da garota com os braços cheios de livros que perde o equilíbrio quando o ônibus freia.
A gente ri da desgraça que virou nossa vida com impostos que sobem mais de 100% ao ano. Do salário que não entra. O santo dinheiro do nosso suor, que mal dá para pagar as contas do mês e o qual não temos o direito de receber em dia.
A gente acha legal o bolsa-família, bolsa-estudo, bolsa-gás, bolsa-puta-que-o-pariu que o governo paga com o dinheiro que trabalhamos duro para ganhar. Achamos bonito a pessoa que vive em situações miseráveis, que não tem o direito à dignidade de trabalhar e ganha a comida, mas não ganha respeito.
Às vezes, a gente até se choca com assassinatos brutais. Mas no mês seguinte ninguém lembra de mais nada, e logo o assassino está nas ruas e é mais um que ri de nós.
Aqui no Brasil, os políticos corruptos não tem mais nem a dignidade de rir pelas costas do povo. Ri na cara mesmo. Se lixa para a opinião pública, já que pela inércia o público parece não ter opinião.
A imprensa vendida. Os jornalistas de alma vendida. Por que ser diferente num país em que ninguém se importa? É o que EU JÁ OUVI DE VERDADE. Quando alguma mídia mostra nossa triste realidade, seja com humor ou não, a gente até se incomoda. Ri... E aí? Logo estamos votando errado de novo. E não é por inocência. Optamos pelas mesmas pessoas. E então faz todo o sentido do mundo passar meia hora ouvindo notícias ruins no jornal da manhã e a âncora terminar tudo com um sorriso singelo e um: "Bom dia e boa semana".
Teremos uma boa semana. Um final de semana alegre. Sem dinheiro para a cerveja. A gente vai lá e estoura um pouquinho o limite. E engole tudo. Sente o gosto amargo da derrota de não ter forças para reclamar. E espera o ínicio da novela ou o fim da noite.
"Não acomodar com o que incomoda", diz Fernando Anitelli. Só é complicado mesmo quando a gente olha em volta e parece que é o único que se incomoda.

Todo mundo cansado de ver esse vídeo...Mas vou postar de novo. Pra gente rir, né? Porque se manifestar mesmo, tá difícil.

sábado, 2 de maio de 2009

O retratinho

Eu estava tranquila. Sem frio para agasalhar. Sem sol para aquecer. Sem vento que arrepiasse os pêlos da nuca. Estava ali. Normal. Ser morno parece simples, mas é complicado. Isso porque quando se é morno, não há paixão. Quando se escreve morno, as letras saem retinhas, emparelhadas, sem provocar sensação ou sentimento. Ou se é frio, ou se é quente. Ser morno é conformismo. É levantar, beber o leite, trabalhar, voltar, trabalhar, ver a novela na TV e dormir depois de acalmar o coração não com amor, mas com remédio. E aqui estava tudo morno, sabe? Tão morno que dava medo.
De repente ele caiu no chão. O retratinho.

- Era 3x4, menina?
- Não, nem isso. Era um retratinho tão pequeno...

No retratinho estava o rosto do meu primeiro gesto de coragem, da primeira vez que liguei o foda-se. Era o retratinho da minha primeira descoberta de que existe mundo demais. Quando percebi que basta querer para colocar o pé na estrada e fazer sonhos serem realidade. Só é preciso disposição para encarar o mundo exterior e ter coragem para mergulhar no fantástico mundo interior - nosso e dos outros. E por que então estou aqui?

O retratinho esquentou tudo. Esquentou o incômodo pelo comodismo. Esquentou o zíper da mochila aberta esperando para ser preenchida. Esquentou o interesse pelos olhares invisíveis dentro do ônibus. E era só o seu retratinho, que ainda levo no coração mesmo com todas as transformações e problemas da vida. Era só aquele seu retratinho, sabe? Aquele mesmo da despedida...